quinta-feira, 13 de maio de 2021

O CANDOMBLÉ E OS PRETOS VEHOS


 Conteúdo em Áudio Abaixo do Texto.

No mês de maio as Casas de Umbanda festejam os Pretos Velhos. Já os Barracões de Candomblé, dividem-se. Uns, aderem aos festejos. Outros, fazem questão de rejeitar as comemorações, alegando inexistir culto aos Pretos Velhos na Liturgia africana. Acho mais do que pertinente lançar algumas ponderações a respeito.

Não resta sombra de dúvidas que o culto aos deuses africanos no Brasil (como já diferiam Pierre Verger e Roger Bastide) não é igual ao da África. E não foi apenas o Oceano Atlântico que proporcionou as distinções. Além da geografia, o tempo, a cultura, os aspectos sociais, os episódios históricos, os novos sentires, os novos olhares e a própria fauna e flora, contribuíram decisivamente para que várias alterações fossem realizadas no rito original. O que eu chamo de “releitura”. Nada engendrado, nem premeditado. Apenas ocorrido. 

Todavia, adaptado ou não; relido ou não, a organização sócio-religiosa que nós chamamos de Candomblé só existe no Brasil graças aos negros africanos de diversas etnias e a seus descendentes. Graças a eles. À alma deles.

Naquela época, dizia-se que os “negros não tinham alma”. Mas hoje, há que se dizer: tinham, sim! Têm, sim! O Candomblé deve sua existência à alma deles! Dos “Pretos Velhos”, dos “Pretos Novos”, dos “Pretos”, dos velhos, dos novos. Negar a importância daqueles homens e mulheres sábios e briosos na formação do Candomblé, é negar novamente e preconceituosamente sua alma, seu espírito guerreiro, sua dignidade, sua força.

Os negros africanos chegaram nesta terra distante em condições precárias, despojados de sua liberdade, família, bens e costumes. Mas não abandonaram sua religiosidade.

Foram confinados em navios pútridos e em galpões inabitáveis. Separados dos seus, foram vendidos como animais em praça pública até serem finalmente jogados em senzalas onde eram misturados com outros desafortunados. Congoleses, angolanos, daomeanos, iorubanos, trabalhavam de sol a sol, sem direitos, sem reconhecimento.  

A despeito de tudo, esse povo corajoso não deixou que se perdesse o único bem que lhes restara a salvo de seus algozes: sua crença.

Em que pese o massacre físico e emocional, os escravos mantiveram acesa a chama da fé. Venceram a opressão, a dor física e o sofrimento moral. Apesar de proibidos de cultuar seus Deuses pela brutalidade dos feitores, encontraram no sincretismo com imagens de Santos católicos, uma forma de lograr os brancos e agradar aos seus ancestrais.

Se hoje, séculos após, podemos livremente bater no peito e erguermos a voz para nos dizermos candomblecistas, devemos àquele Povo heróico, que conseguiu a proeza de, na condição de escravos, perpetuarem sua herança; manterem viva sua memória.

O Candomblé deve sua alma a eles. O Candomblé tem a “alma” deles. Negar isso é negar novamente a alma dos negros.

Os fundadores “dos Candomblés” são nossos ancestres, são nossos “ésà”. São nossos “mais velhos”. São nossos “Pretos Velhos”. Se do Benin, de Angola, do Congo, ou de Kétu. Não sei. Não sei em que terra, ou terreiro. Não sei. Sei que os quero por perto. Bem perto. Salve a alma deles! Adorei as almas!

Salve Joaquim, Benedito, Roque, Maria Joana, Aninha, Senhora, Talabi, Salakó! Salve! Salve Menininha, Salve Stella, Salve Olga, Salve Beata! Salve as almas dos “Pretos”! Salve a viva alma dos “Velhos”!

Texto : Márcio de Jagun
#Povodafloresta 🍃🌿

Conteúdo em Áudio




Dandara: 133 anos de falsa abolição


Arquivo Frente Brasil Popular MG *Dandara Tonantzin é pedagoga, mestranda em educação e vereadora pelo PT em Uberlândia -MG

A liberdade nunca bateu na nossa porta: 133 anos de falsa abolição Três séculos de tortura, assassinato, privação de liberdades e estupros não se apagaram em 133 anos de abolição da escravatura. O genocídio continua.

A história oficial nos conta que no dia 13 de maio de 1888 a “benevolente” princesa Isabel assinou a Lei Áurea, salvando o povo negro dos horrores da escravidão. O que não consta nos livros tradicionais é que a abolição foi fruto de muita luta de nossos antepassados, que resistiram com fugas organizadas dos cativeiros, rebeliões, quilombos e lutas abolicionistas. De salvadora a princesa branca não teve nada; a lei foi assinada por pressão econômica internacional inglesa que desde 1845 proibia o tráfico negreiro.

Cerca de 4,8 milhões de africanos foram sequestrados de suas famílias e encarcerados em navios tumbeiros para o Brasil. O trajeto era desumano e a vida dos sobreviventes era rodeada de perversidade. Latifúndios eram campos de concentração onde pessoas escravizadas eram tratadas pior que animais de carga. Apesar de tanta dor, sobrevivemos e construímos esse país à sangue e suor. A contribuição que demos para a construção da pátria ainda é negada. Ainda aparecemos nos livros de história somente nas páginas que remetem ao crime da escravidão.

Somos bisnetos (as) de guerreiros e guerreiras, que saíram da escravidão sem reparação alguma, sem direitos à terra, à educação ou moradia. Sem perspectivas, o povo negro começou a habitar as periferias ao redor dos centros urbanos que se formavam. No dia 14, após a lei de abolição, o que restou para nós?

Por isso hoje não comemoramos a falsa abolição, chancelada pelo viés branco. Hoje exigimos respeito e igualdade, mesmo que tardia. A escravidão deixou marcas na nossa história. No momento em que nascia o Brasil, a escravidão era mais do que somente um modelo econômico, era um sistema político, cultural, social, que constituiu valores, que organizou geopoliticamente as cidades, determinou lugares e não lugares. O preconceito racial se enraizou de tal maneira em nossa sociedade que o racismo se tornou estrutural, presente nos discursos de ódio da internet, nas piadinhas sobre o cabelo ou traços afros, na ausência de pessoas negras em cargos de liderança e espaços de poder.

Hoje, negros são 79,1% das vítimas de intervenções policiais que resultam em morte, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2020. Somos também 66,7% dos encarcerados nas prisões brasileiras. Durante a pandemia de Covid-19 morreram 40% mais pretos e pardos do que brancos.

A chacina de Jacarezinho, no dia 06 de maio, nos lembra que os fantasmas da escravidão seguem os passos de cada pessoa negra nesse país: Na desvalorização, no medo, na perseguição, na fome, nos estigmas, na bala perdida que sempre encontra o corpo negro. Nossa cor de pele é alvo. Nossa cultura, nossos ritmos, nossa fé.

No dia 13 de maio de 2021 são milhares de mães pretas que velam seus filhos assassinados, desaparecidos, crimes que nunca tiveram justiça. Miguel Santana, Clayton da Silva Freitas Lima, Cláudia Silva Ferreira, Ray Pinto Faria, Jenifer Gomes e tantos mais. Se tornaram vítimas de sistema cruel, onde o preto é suspeito e nossas lágrimas não importam.

Temos pressa para que as coisas mudem. Já são 133 anos de um grito preso na garganta. Diferente do que canta o hino nacional, o sol da liberdade não raiou para todos (as) nós. É cansativo ainda lutarmos pela quebra das correntes do racismo.

Ocupamos espaços importes, por exemplo, sou uma mulher negra na Câmara de Vereadores de Uberlândia. Olho para o lado e vejo os herdeiros da casa grande até hoje no poder. Não toleram a nossa presença, incomodamos. Nada para o povo preto foi de graça, ou por acaso. A libertação nunca bateu na nossa porta. Tudo foi, tudo será: LUTA.


quarta-feira, 12 de maio de 2021

CHEFE DA PM-RJ CORONEL CARLOS CERQUEIRA, ASSASSINADO EM 1999 POR TENTAR HUMANIZAR A POLICIA MILITAR DO RIO DE JANEIRO.

 


O coronel Carlos Cerqueira foi o policial negro que tentou humanizar a Polícia Militar do Rio de Janeiro e acabou assassinado em um crime até hoje polêmico.

Nos anos 80, o coronel Carlos Magno Nazareth Cerqueira já tinha pelo menos duas décadas de trabalho policial. Ele foi nomeado pelo governador Leonel Brizola para ocupar o cargo de Secretário Chefe de Polícia Militar, órgão recém-criado pelo então governador do Rio de Janeiro, em 1983.

Carlos Cerqueira era umdefensor dos direitos humanos e tinha um entendimento do crime como um produto social, fruto da pobreza e desigualdade. Defendia, desde a época de oficial, que a polícia não deveria usar truculência e violência desmedida contra moradores da periferia, pois nem todos ali eram bandidos. Braço direito de Brizola na segurança, Cerqueira combateu maus policiais e grupos de extermínio durante os anos 80 e início dos anos 90.

Por ser visto como um homem que perseguia policiais e atrapalhava negócios escusos da polícia, Carlos Cerqueira foi perseguido pela própria instituição. Tendo feito muitos inimigos na alta cúpula policial.

Em 1999, o coronel, já reformado, participava de uma reunião da ONG de direitos humanos da qual fazia parte, no edifício Magnus, na cidade do Rio, Cerqueira foi assassinado no saguão do prédio onde trabalha o advogado Nilo Batista, ex-vice-governador.

Duas horas depois, a polícia dava o crime como praticamente elucidado. O assassino seria o sargento Sidney Rodrigues, da PM, atingido, em seguida ao crime, por um tiro na nuca, supostamente disparado por um segurança da terma Aeroporto, que funciona no térreo do edifício.

Cerqueira chegou ao prédio (avenida Beira Mar, 216, centro) pouco depois das 16h. Ele trabalhava com Nilo Batista no Instituto Carioca de Criminologia, uma ONG (organização não-governamental).

Testemunhas contaram aos policiais responsáveis pela investigação que o sargento atirou com um revólver assim que o coronel parou no saguão à espera do elevador.

Segundo as testemunhas, o tiro atraiu pelo menos dois seguranças da terma. O suspeito teria enfrentado os seguranças, mas foi baleado. Às 19h, ele estava sendo operado no hospital Souza Aguiar (centro).

Cerqueira morreu na hora. Há controvérsias sobre se ele esboçou reação. Debaixo do cadáver, o perito Oswaldo de Paiva Netto, do Instituto de Criminalística Carlos Éboli, achou um coldre vazio. A arma não apareceu.

O perito encontrou uma cápsula de bala calibre 38 no corredor dos fundos do prédio. Encontrou ainda uma marca de tiro na parede do saguão, mas a cápsula não foi localizada.

Foi apreendido no local o revólver 38 que teria sido usado pelo assassino, A arma tinha quatro cápsulas deflagradas.

Pessoas que trabalhavam no prédio contaram ter ouvido cinco ou seis disparos. A polícia recebeu de um flanelinha (pessoa que toma conta de carros na rua) a informação de que um homem negro e alto teria fugido em correria logo após os tiros.

Retrato falado do suposto assassino coincide com o semblante do sargento, disse à noite o delegado Gilberto Ribeiro, da 5ª DP, delegacia responsável pela área onde o crime ocorreu.


Pai de sete filhos, Cerqueira estava aposentado na Polícia Militar, desde o fim do segundo governo de Brizola, em 94.

Estudioso da questão da violência, ele trabalhava como vice-presidente da ONG, que funciona no escritório de Nilo Batista.

Interdição

Depois do crime, o prédio foi interditado. Todas as pessoas que estavam nos escritórios de seus 13 andares foram cadastradas. Ninguém entrava ou saía do prédio sem autorização.

O coronel Valmir Brum, da Central de Inquéritos da Procuradoria Geral de Justiça, disse que vingança é a hipótese mais provável.

"Quem fez isso, fez para matar", afirmou ele.

Basquete

Subsecretário da Casa Militar no segundo governo Brizola, o coronel Heleno Barbosa disse que Cerqueira se encontraria no prédio com Nilo Batista.

Os dois seguiriam para uma partida de basquete, esporte preferido do coronel.

"O coronel Cerqueira era um homem íntegro, defensor dos direitos humanos e que instituiu o policiamento comunitário. Foi um crime bárbaro", afirmou Brum.

Fontes: wikifavelas   , folha.uol.com.br , historiaeparcerias.rj

terça-feira, 11 de maio de 2021

"VÃO ME MATAR!"

 

Essa foi a frase dita por seu Antônio Correia no dia 02 de março de 2020, durante uma reunião da SDR (Secretaria de Desenvolvimento Rural), em Salvador.

Na ocasião, seu Antônio ,Koinonia e outras instituições debateram sobre a gravidade do conflito de terra que ele estava envolvido em Camamu, e que já vinha se arrastando desde 2014. E como previu naquele dia, DOIS MESES depois, ele foi morto com 3 tiros, dentro de sua casa.

O conflito se deu com pessoas da comunidade do Varjão, referente ao uso de uma casa de farinha que está localizada numa área da comunidade quilombola do Barroso.

Essa área era da família de seu Antônio e foi doada para a associação para ser de uso coletivo da comunidade, conforme explicamos em uma matéria publicada no site OQ, e que pode ser lida no link: bityli.com/5AT5D.

Hoje faz um ano que seu Antônio foi assassinado, e a morosidade da justiça ainda não deu conta de punir os assassinos e responder para a comunidade quem são eles e o motivo do assassinato.

Ontem e hoje publicamos vídeos dos amigos e familiares do seu Antônio, que vieram a público clamar por justiça e pedir pela punição dos culpados.

O assassinato de seu Antônio, assim como o da vereadora #MarieleFranco, é um dos muitos casos de assassinato de líderes comunitários e representantes do povo que estão sem resposta. Não podemos deixar esses crimes impunes, e é por isso que Koinonia se junta à comunidade de Camamu, ao povo do Quilombo do Barroso e pede por justiça.



Nós queremos saber: QUEM MATOU SEU ANTÔNIO CORREIA?


segunda-feira, 10 de maio de 2021

GUARACY MINGARDI: “A POLÍCIA FEZ TUDO ERRADO NO JACAREZINHO. NOSSA LEGISLAÇÃO NÃO TEM PENA DE MORTE”

 

 Manifestantes protestam contra o massacre no Jacarezinho, no Rio de Janeiro, em frente à Polícia Civil, na última sexta, 7 de maio.ANTONIO LACERDA / EFE

O ex-investigador e cientista político, que estuda há mais de duas décadas as polícias e a segurança pública no Brasil, diz que faltou inteligência à Polícia Civil. Ele defende investigação independente sobre o massacre.

O ex-investigador e cientista político Guaracy Mingardi define a operação na favela do Jacarezinho, na zona norte do Rio de Janeiro ―que deixou 28 mortos na última quinta-feira, entre eles um policial que atuava na ação―, como um “morticínio”, que não deveria ter acontecido caso a Polícia Civil agisse pautada pela investigação e inteligência, e não pela lógica do confronto. Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o ex-policial estuda organizações criminosas há mais de duas décadas e destaca a militarização das polícias como um problema ao funcionamento da instituição. “O tráfico se armou, a polícia foi se armando cada vez mais e a população foi ficando cada vez mais aprisionada no meio deles.”

A operação Exceptis tinha como objetivo cumprir 21 mandados de prisão contra investigados por aliciar crianças e adolescentes para o tráfico de drogas no Jacarezinho, região cujo narcotráfico é dominado pelo Comando Vermelho, e onde vivem cerca de 40.000 habitantes. Dos 21 investigados, três foram mortos e outros três presos. Foram apreendidos seis fuzis, 16 pistolas, uma submetralhadora, 12 granadas e uma escopeta calibre 12. Mas ao menos 13 pessoas mortas não eram investigados na operação, que é considerada a mais letal da história do Rio e a segunda maior chacina registrada no Estado. Há vários relatos de violações de direitos humanos feitas por moradores do Jacarezinho. Mas a Polícia Civil nega ter descumprido regras, critica o “ativismo judicial” dos detratores da ação e insiste que todos os mortos eram criminosos, com exceção do agente.

O EL PAÍS entrevistou o especialista em segurança pública neste sábado, por telefone. Na conversa, Guaracy Mingardi ―que é autor do livro Tiras, Gansos e Trutas: cotidiano e reforma na Polícia Civil―, apontou o que considera os principais erros cometidos pela corporação.

Pergunta: Como avalia o resultado da operação da última quinta na favela do Jacarezinho?

Resposta: Foi uma coisa que não deveria ter acontecido. É o tipo de operação que não deve ocorrer, porque virou uma guerra. Na verdade, o trabalho que deveria ser feito não era esse. A Polícia Civil não está lá para fazer operação atirando; deve investigar, ir atrás dos criminosos, cumprir os mandados de prisão, mas não trocar inúmeros tiros em uma área urbanizada. Então foi uma coisa que começou errada ―por ter sido uma operação desse tipo―, e continuou errada o tempo todo. Inclusive, se não tivessem feito essa bobagem, e sim esperado para, aos poucos, ir prendendo cada um deles não teria morrido um policial, nem ninguém.

P: Como podemos qualificar esta ação?

R: O que aconteceu foi uma chacina, um morticínio, uma tragédia. Estão falando que todos eram criminosos, mas eu não vi. E mesmo que fossem criminosos, a nossa legislação não tem pena de morte então não era para eles serem mortos, e sim presos. Quando acontece algo desse porte, não se pode dizer outra coisa a não ser que foi uma chacina, uma tragédia, e a polícia fez tudo errado.

P: Chama a atenção o fato de a operação mais letal da história do Rio de Janeiro ter sido feita pela Polícia Civil, cujo papel é investigar? O que levou a uma ação tão letal pela instituição?

R: A Polícia Civil tem o dever de cumprir os mandados de prisão. Eram 21 investigados por suspeita de aliciar menores para o tráfico de drogas, motivo da entrada policial. Só que o problema é a forma. Como a Polícia Civil se militarizou demais ―e isso em todo o Brasil―está agindo através de operação, quis pegar todo mundo junto, e não pega. Vários deles não deveriam nem estar lá, mas para você saber onde eles estão precisa de investigação, um trabalho de inteligência muito bom. Quando se faz uma operação dessas botando tanta gente e pega menos de um terço do que era procurado, tem alguma coisa errada. A inteligência não foi tão boa, a informação que chegou não foi boa. Para localizar pessoas, por exemplo, quando teve uma série de guerras na Rocinha, depois de um certo tempo, um dos principais criminosos foi preso pela Polícia Civil sem trocar um tiro fora da Rocinha, porque ele estava se escondendo e através de investigações e prenderam sem dar um tiro, é essa a ideia.

P: A Polícia Civil afirma que a única execução foi a do policial André Frias, e que todas as outras mortes foram para neutralizar os traficantes. Mas soube-se depois que pelo menos 13 mortos nem sequer eram investigados naquela ação. Como vê isso?

R. Quando você entra atirando não escolhe alvo. Acaba matando quem está reagindo, quem não  tem nada a ver com nada. Não se pode fazer uma guerra na área urbana, a polícia não existe para isso. Na guerra, você entende: morre inocente e quem tem a ver, mas é uma guerra. Agora, o que aconteceu, não. Era para ser feito a prisão de alguns criminosos, afinal, não conseguiram pegar todos eles. Eles fizeram tudo isso para pegar pouca gente e mataram muitos, ou seja, a ideia está toda errada. Eu sempre falo isso: quem faz operação é médico, polícia não tem que fazer operação.

P: Em qual contexto acontece esta militarização das polícia e desde quando?

R: As do Rio começaram a se militarizar antes, por conta do Comando Vermelho. Na época [final dos anos 1970] e depois, por conta de outras organizações criminosas (que eu não chamo de facções), as polícias começaram a se armar muito. Primeiro a PM e depois a Civil partiram para esse tipo de guerra. E por trás disso tudo está a ideia de guerra contra às drogas, então você deixa a droga mais cara e na mão dos criminosos, dos mais violentos possíveis, e não adianta nada. Você faz uma guerra prolongada e nem consegue diminuir a droga circulando? Alguma coisa está errada nessa política. Como eu disse, não é exclusivo do Rio de Janeiro, acontece quase que no país todo, mas não em todos os Estados, essa militarização da repressão ao tráfico, mas as cacas maiores dos últimos tempos aconteceram lá.

O tráfico se armou, a polícia foi se armando cada vez mais e a população fica aprisionada no meio deles.

P: É possível dizer que há um antes e depois do Comando Vermelho no que diz respeito à atuação das polícias?

R: No Rio você sempre teve aquele problema de dificuldade da polícia em subir o morro, mesmo antes das organizações criminosas, já se tinha as quadrilhas, era difícil de chegar, bem complicado. Quando o Comando Vermelho começou a tomar o espaço, como no Santa Marta e na Cidade de Deus, ficou cada vez mais difícil para a polícia chegar. Depois que os criminosos começaram a usar fuzil, a polícia também começou a usá-los e foi evoluindo nisso. Cito uma bobagem carioca de fuzil, nas palavras de Wilson Witzel (governador do Rio que sofreu impeachment por irregularidades na área da Saúde), que é o seguinte: o tiro de precisão do helicóptero não existe, por causa da trepidação não dá para dar tiro de precisão. Não adianta ter um atirador muito bom que você não consegue. Essa é a maior estupidez de todas, ou seja, para resumir: o tráfico se armou, foi ficando cada vez mais armado e pesado, a polícia foi se armando cada vez mais e ficando pesada. São dois lados muito preparados para trocar tiros, e a população fica aprisionada no meio deles: da polícia e dos criminosos. Se não pegarmos pesado agora para impedir, vai continuar a acontecer.

P: O que distingue as atuações do Comando Vermelho e do Primeiro Comando da Capital (PCC), as maiores organizações criminosas do Brasil, e como isso influencia no trabalho da polícia?

R: O contexto histórico do Rio de Janeiro, do armamento, da polícia que foi se militarizando e tem a questão do Comando Vermelho, que o pessoal é mais porra louca mesmo, muito diferente do PCC, por exemplo. O pessoal do PCC matar policiais? Precisa de autorização lá de cima no PCC. Então, na verdade, o Comando Vermelho é cheio de porra louca que fazem o que quer. Só que a polícia não pode ser cheia de porra louca, a polícia é uma organização profissional e tem que agir profissionalmente, essa é a diferença. Os criminosos não estão nem aí em troca de tiros e atiram no meio da multidão. Eles não estão nem ligando se isso ocorrer, agora, a polícia, tem que se importar com isso. A polícia está ali para proteger a população, essa é a função dela.

P: A Organização das Nações Unidas pediu na sexta-feira que haja investigação independente para elucidar a chacina. Quem deveria conduzir as investigações deste episódio? 

R: Eu sou favorável às investigações independentes assim como sou favorável à Ouvidoria de polícia com poder de investigar. Ouvidoria de polícia não constituída por policiais, mas sim por pessoas que são contratadas pelo Estado e que verificam elas antes de passar adiante. Mas aí é um caso que vai além de uma simples Ouvidoria de polícia: é o caso de que vai ter que ter gente com poder. Na verdade, você teria que ter provavelmente uma ação do Ministério Público, porque o MP pode convocar pessoas para depor. Então isso deveria partir do Ministério Público. E, mesmo que não fosse o MP, deveria ser gente com o poder de convocar pessoas para depor. Não adianta você só ouvir a polícia ou só a população. Você tem que ouvir todo mundo.

P: O Ministério Público (MPRJ) acompanhou na sexta-feira a perícia nos corpos das pessoas mortas no Instituto Médico Legal (IML) e diz que está fazendo uma investigação independente sobre o caso.

R: Pelo menos o MP deu um passo. O problema é que muitas vezes temos o Ministério Público muito ligado, muito amigo da polícia. Tem que ser parceiro de trabalho, mas não amigáveis demais. Quando o policial comete um erro, tem que ser responsabilizado. Não é um erro de um policial, eu não estou culpando todo mundo da operação. É o que aconteceu. Quem foram os reais culpados? Quem mandou aquilo? Quem organizou aquilo? É necessário verificar se não houve execução, porque uma coisa é matar criminoso em um tiroteio e a outra coisa é executar. Quem deixou aquilo acontecer?

FONTE: EL PAIS/BRASIL

 

 

 

segunda-feira, 3 de maio de 2021

Em luta contra o racismo, Thierry Henry inspira boicote a redes sociais

 O técnico Thierry Henry, do Montreal Impact, ajoelha-se em homenagem ao movimento Black Lives Matter em 16 de julho de 2020 

Foto: Michael Reaves/Getty Images

     Ex-jogador fechou contas nas redes depois de ataques racistas a jogadores; futebol inglês faz protesto neste fim de semana

Faz cinco semanas que Thierry Henry excluiu suas contas nas redes sociais e que o ex-atacante do Arsenal vem passando por uma série de emoções.

O agora técnico tomou a decisão no final de março, após uma onda de abusos racistas online dirigidos a jogadores de futebol negros e o que ele classifica como incapacidade das empresas de mídia social de responsabilizar os usuários por suas ações.

Henry diz que não estar no Instagram ou no Twitter nas últimas semanas tem sido "ótimo".

"No início, eu estava com um humor meio estranho, digamos, e eu estava tipo: 'As pessoas não estão percebendo o que está em jogo aqui e o problema que esta sociedade tem agora'.”

"Mas eu estava sempre falando e citando a força do grupo, e às vezes, quando você tem que gritar algo sozinho, você se sente solitário - mas eu não estou falando de mim, estou falando sobre as pessoas que foram atacadas, assediadas pela aparência, pelo que acreditam, pela cor da pele, nas redes sociais.”

"Talvez se eu sair das redes sociais, tomando uma posição pelas pessoas que talvez não tenham voz, seja possível criar uma onda. As pessoas gostariam de saber por quê. Depois disso, houve um pequeno período em que eu pensei: 'Bem, é uma pena que as pessoas não estejam reagindo.'"

Apesar de o Twitter e o Instagram - que é propriedade do Facebook - anunciarem recentemente medidas para tentar combater o problema, os ataques racistas online contra jogadores de futebol negros continuaram.

Quando Henry tomou pela primeira vez a decisão de deletar suas contas nas redes sociais, o homem de 43 anos disse à CNN que esperava inspirar outras pessoas a se posicionarem contra o abuso racista e o bullying online. Cinco semanas depois, suas ações certamente surtiram o efeito desejado.

Nessa sexta-feira (30), os clubes da Premier League, English Football League, Women's Super League e Women's Championship, órgãos dirigentes e organizações como Kick It Out iniciaram um apagão de três dias nas redes.

Algumas das maiores emissoras do Reino Unido, como Sky Sports e BT Sport, também participam do apagão, que terminará nesta segunda-feira (3). 

“Se [saindo da mídia social] pode causar um pequeno impacto e ter um impacto ... para isso, você precisa da força do grupo”, diz Henry. "Então, quando vi que isso aconteceu recentemente, fiquei realmente feliz, mas estava pensando em todas as pessoas que esperavam por isso há muito tempo. É uma ótima ferramenta, como falamos, mas as pessoas às vezes usam isso como uma arma.”

"Gosto do fato de que as pessoas realmente percebem que, quando nos reunimos, é... poderoso. Percebi que talvez o fato de eu vir desse meio pudesse criar uma pequena onda na mídia e criou, fazendo com que as pessoas respondessem a algumas perguntas. Quando vi o que começou a acontecer neste fim de semana, eu pensei: 'Ok, Ok, é um começo, é um começo.’”

"Muitas pessoas estão - não estou dizendo acordando porque todos estavam cientes disso - mas agora falam alto sobre isso e têm a mesma energia que colocam na Super League. Parece que estamos conseguindo ser corajosos para tentar fazer com que essas grandes empresas respondam às perguntas que temos. E eu sei que não é fácil também do lado deles, mas esse é o trabalho deles."

A posição das redes sociais

Desde que o boicote foi anunciado, o Twitter e o Facebook reiteraram o desejo de remover todos os tipos de abusos das plataformas.

"Não queremos abusos discriminatórios no Instagram ou no Facebook", disse um porta-voz do Facebook à CNN. “Compartilhamos o objetivo de lidar com o problema e responsabilizar as pessoas que o compartilham. Fazemos isso tomando medidas em relação a conteúdos e contas que violam nossas regras e cooperando com as autoridades policiais quando recebemos uma solicitação.”

"Estamos comprometidos em combater o ódio e o racismo em nossa plataforma, mas também sabemos que esses problemas são maiores do que nós, então esperamos continuar nosso trabalho com parceiros da indústria para resolver o problema - tanto online quanto offline."

Questionado pela CNN sobre a ausência contínua de Henry de sua plataforma, um porta-voz do Twitter disse: "O comportamento racista, o abuso e o assédio não têm absolutamente nenhum lugar em nosso serviço. E ao lado de nossos parceiros no futebol, condenamos o racismo em todas as suas formas.”

"Estamos firmes em nosso compromisso de garantir que a conversa sobre futebol em nosso serviço seja segura para os torcedores, jogadores e todos os envolvidos no jogo.”

“O racismo é uma questão social profunda e complexa e todos têm um papel a desempenhar. Estamos empenhados em fazer a nossa parte e continuar a trabalhar em estreita colaboração com parceiros valiosos no futebol, governo e polícia, juntamente com o grupo de trabalho convocado pela Kick It Out para identificar maneiras de lidar com esse problema coletivamente - tanto online quanto fora da mídia social. "

De acordo com o Twitter, ele tentou entrar em contato com Henry e gostaria de ter a oportunidade de falar com ele.

O Instagram esteve em contato com o representante de Henry, antes de ele deixar a rede social e desde então.

 Henry disse à CNN que não falou diretamente com ninguém no Instagram, mas disse que a empresa entrou em contato com seus representantes. Henry recusou a oportunidade de se encontrar com alguém no Instagram, pois quer que a prioridade das empresas seja tomar medidas para acabar com os abusos.

“Temos tantas, tantas discussões. Eu só quero ação. É isso. Sobre o que vamos falar? Me contando o que [declaração] você acabou de divulgar?"

Henry diz que o blecaute é uma iniciativa bem-vinda, mas adverte contra a complacência. Ele entende que continuará a ser uma batalha difícil e admite que talvez nunca a veja se concretizar, mas é inabalável em seu compromisso com a luta.

“[O que] o mundo do futebol inglês está fazendo neste minuto e o que vai acontecer no fim de semana, as pessoas me perguntam. E eu: 'É um começo.' Mas sim, temos uma voz. Podemos realmente conscientizar as pessoas de nossa desaprovação e esperar que as coisas mudem. Se você não fizer nada, nada mudará. Como eu sempre disse, se você tentar fazer algo, poderá ter sucesso ou não, mas você está conscientizando as pessoas e, ao longo do caminho, terá um impacto.”

"Talvez não este ano, talvez não em dois anos, talvez não em três anos. Talvez não possamos ver, mas você tem que fazer alguma coisa."

Organizações de mídia do Reino Unido aderiram ao boicote às redes sociais neste fim de semana. A CNN decidiu não aderir, mas acredita ter uma voz única para relatar esta campanha e outras semelhantes. A CNN está empenhada em reportar questões de racismo e assédio online onde quer que ocorram no mundo.

 

(Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês).


Reportagem CNN




sábado, 1 de maio de 2021

BANCADA NEGRA FORMALIZA A FRENTE PARLAMENTAR ANTIRRACISTA EM PORTO ALEGRE

 

A primeira bancada negra da história de Porto Alegre criou a Frente para articular políticas e ações antirracistas

Aprovada por unanimidade em fevereiro deste ano, a Frente Parlamentar Antirracista foi formalizada nesta quinta-feira (29). Construída por toda a bancada negra, a coordenação da Frente será dividida pelas vereadoras Karen Santos (PSOL), Bruna Rodrigues (PCdoB), Daiana Santos (PCdoB), Reginete Bispo (PT) e o vereador Matheus Gomes (PSOL). De acordo com os parlamentares, ela será o espaço unificado da bancada negra e dos vereadores solidários à causa negra em Porto Alegre, com o objetivo de articular políticas e ações antirracistas.

O ano de 2020, para além do início da pandemia, foi o ano em que reverberou pelo mundo que "vidas negras importam". A morte do estadunidense George Floyd e, posteriormente, o assassinato João Alberto Silveira Freitas, em Porto Alegre, fizeram com que, no meio do isolamento social, manifestantes saíssem às ruas dizendo basta ao racismo e à morte do povo negro. Levante que teve reflexo nas urnas da capital gaúcha, que elegeu em novembro sua primeira bancada negra.

Desde então, os cinco parlamentares vêm trabalhando e denunciando ações racistas como a ocorrida no dia 21 de abril, em que manifestantes direitistas usaram um carrasco e um boneco enforcado, em alusão à Ku Klux Klan, organização racista, antissemita, anticatólica e anticomunista fundada no século 19 no Sul dos Estados Unidos. Neste contexto, a Frente Parlamentar Antirracista se torna mais um importante passo, apontam os parlamentares.

“A criação da Frente foi uma das primeira ações propostas pela nossa bancada, por representar essa importância em nossas vidas, na vida de cada um que constitui a Bancada Negra e de cada mulher e homem negro que nos ajudou a chegar até aqui”, aponta Bruna Rodrigues (PCdoB).

A vereadora Daiana Santos (PCdoB) afirma que a conquista do espaço no Legislativo da Capital é uma oportunidade "para politizar absolutamente tudo". Segundo ela, "é assim que vamos ter a certeza de que essa construção real de espaços não será passageira, não só pela eleição desses cinco vereadores negros que já estão na história dessa cidade, mas que poderemos construir o ganho de consciência e o protagonismo do nosso povo preto, algo que vai seguir mobilizando e reverberando por anos”.

Segundo Bruna Rodrigues, a intenção é que a Frente seja um espaço de debate, mas, essencialmente, de criação de políticas públicas que dialoguem com as necessidades da população negra de Porto Alegre. “Como mulher negra, a minha luta se construiu a partir dessa identidade, dessa vivência, e na Câmara de Vereadores é urgente não só o lavante dessa pauta, mas a utilização dela como base fundamental para o exercício político. Ainda lutamos para existir com dignidade e isso faz com que tenhamos a necessidade de construir instrumentos que deem suporte a essa construção. Ocupamos este espaço e queremos fazer dele um instrumento potente de ampliação de vozes e de combate ao racismo”, afirma. 

Vereadora em exercício e representando o primeiro mandato coletivo da Capital, Reginete Bispo (PT) destaca que a cidade de Porto Alegre é uma das mais segregadas do país. Ela chama atenção para as mobilizações no último ano. “Esse tema mobilizou o mundo. Em plena a pandemia, quando o mundo estava em isolamento, o isolamento foi quebrado porque as pessoas foram às ruas dizer que vidas negras importam. Isso acontece porque o racismo contra as pessoas negras, e aqui no Brasil contra as pessoas negras e indígenas, assumiu uma proporção insuportável, as pessoas estão sendo mortas, o racismo vem se apresentado em suas mais diversas formas”, pontua.

Neste contexto, complementa Reginete, "quando o ódio racial cresce de uma maneira gigantesca e está naturalizado na fala e nos atos das pessoas, especialmente de alguns governantes, como por exemplo o nosso presidente da República, a Frente tem uma importância muito grande”, finaliza.

Conforme destaca o vereador Matheus Gomes (PSOL), o combate ao racismo será pauta transversal no trabalho da Frente, ou seja, do orçamento da cidade ao combate a pandemia. "Quando o IBGE diz que Porto Alegre é a capital brasileira mais segregada racialmente, fala do acesso à educação, saúde, de renda e trabalho, expectativa de vida, por isso, iremos dialogar sobre temas concretos da vida do povo negro e de periferia", afirma.

Matheus complementado que a constituição da Frente Parlamentar Antirracista consolida a novidade das eleições de 2020. “Se nos últimos quatro pleitos, apenas dois vereadores negros foram eleitos na primeira chamada, em uma eleição foram cinco vereadores, expressando o avanço da representação política negra no ano das maiores manifestações antirracistas da história”, conclui.

“Ações como o lançamento da Frente Antirracista me trazem esperança. Faz com que possamos olhar para o futuro e compreender que existe uma possibilidade real de construção de algo que é diferente do que sempre nos foi apresentado. A existência dessa frente simboliza aquilo que eu, Laura, Reginete, Karen, Bruna e Matheus desejamos e lutamos: um futuro igualitário, pensando nessa construção de possibilidades reais de ascensão do nosso povo, da classe trabalhadora, que sempre correu atrás. É um movimento necessário, quando nosso povo está sofrendo nesse período tão duro, onde as desigualdades se acentuam”, finaliza Daiana Santos.

Conforme destaca a bancada, o espaço é aberto para participação de todos vereadores não-negros e servirá para formular políticas públicas para a capital gaúcha e articular demandas do movimento social negro na Câmara. Na primeira reunião, participaram mais de 40 entidades e coletivos negros de Porto Alegre, como o Movimento Negro Unificado, a União de Negros pela Igualdade (Unegro) e o Clube Satélite Prontidão.

 *Com informações da assessoria da imprensa

 Fabiana Reinholz Brasil de Fato | Porto Alegre | 30 de Abril de 2021 às 16:24


Piso salarial de enfermeiros e parteiras pode ser incluído na pauta de votações do Senado


A inclusão na pauta de votações do piso salarial para enfermeiros e parteiras (PL 2.564/2020) é uma das reivindicações que devem ser levadas por senadores na próxima reunião de líderes. Ao longo de toda a semana, senadores se manifestaram, em Plenário e pelas redes sociais, a favor do projeto, apresentado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES). O relatório da senadora Zenaide Maia (Pros-RN) é favorável à aprovação, na forma de um substitutivo (texto alternativo).

O projeto institui o piso salarial nacional para enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem e parteiras. O projeto, apresentado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES) fixa o piso em R$ 7.315 para enfermeiros. As demais categorias terão o piso proporcional a esse valor: 70% (R$ 5.120) para os técnicos de enfermagem e 50% (R$3.657) para os auxiliares de enfermagem e as parteiras.

O relatório de Zenaide Maia contém algumas mudanças em relação ao texto original. Uma delas é a previsão de que a jornada normal de trabalho desses profissionais não será superior a 30 horas semanais.  O texto original determinava que o valor do piso seria aumentado proporcionalmente para cargas horárias maiores. A compensação de horários e a redução da jornada podem ocorrer por acordo ou convenção coletiva.

Também foi alterada a data de vigência da lei. O texto original previa a entrada em vigor 180 dias (seis meses) após a data da publicação. O substitutivo determina que a lei entrará em vigor no primeiro dia do exercício financeiro (ano) seguinte ao de sua publicação.

Campanha

Na última reunião de líderes, no dia 23, senadores defenderam a inclusão do projeto na pauta do Plenário. Depois, ao longo da última semana, vários parlamentares fizeram declarações de apoio ao texto nas redes sociais e durante as sessões remotas de votação.

Fabiano Contarato, autor do projeto, disse que pretende seguir com a mobilização para aprovar o texto e dar dignidade salarial para os profissionais que arriscam suas vidas para salvas as dos brasileiros nesta pandemia. Na última quarta-feira (28), ele elogiou o texto apresentado pela relatora e pediu que o projeto seja incluído na pauta.

— Esses profissionais não querem ser chamados de heróis, esses profissionais querem dignidade salarial. Eles estão dormindo nos corredores dos hospitais. Eles não têm alojamento, eles não têm equipamentos de proteção individual, não têm aposentadoria especial. Eles ganham, a maioria deles, menos que um salário mínimo ou um salário mínimo. É muito cômodo fazer um discurso enaltecendo esses profissionais, mas a efetivação disso está na aprovação do projeto — disse o senador.

Para a relatora, um piso salarial nacional possibilitará a oferta de serviços de saúde com qualidade. A senadora disse considerar que não é razoável exigir que justamente aqueles que trabalham nas piores condições recebam os piores salários ou remunerações.  Ela lembrou, ainda, os sacrifícios que estão sendo cobrados deles no período atual.

— Sabem quem vai vacinar a população nos feriados, aos sábados e domingos? O pessoal da enfermagem, gente. São os técnicos e enfermeiros que vão trabalhar. E 89% dos trabalhadores em enfermagem são mulheres. Esse projeto senador Fabiano Contarato, conta com o apoio da Bancada Feminina — disse a senadora, também em sessão remota.

O senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) também manifestou apoio ao pedido de Contarato. Para ele, o piso é merecido, não só pelo momento atual, mas pelo trabalho que eles sempre fizeram.

— É um piso mais do que justificado não apenas por estes momentos árduos, áridos, cáusticos, dolorosos e atrozes que nós vivemos na pandemia, que terminam por mostrar a importância de técnicos, de auxiliares, de enfermeiros a quem não tem essa dimensão. 

Fonte: Agência Senado

sexta-feira, 30 de abril de 2021

DESIGUALDADE QUE MATA.

Sepultadores trabalham no cemitério de Vila Formosa, na capital paulista. Foto: Karime Xavier/Folhapress

Estudo inédito mostra que pobres, negros e pessoas de baixa escolaridade correm risco maior de morrer por Covid na cidade de São Paulo

A ilusão de que a Covid-19 seria uma doença democrática e atingiria da mesma forma todas as raças, classes e gêneros durou pouco – os números da pandemia escancararam ainda mais a desigualdade brasileira. É o que comprova o estudo Social Inequalities and Covid-19 Mortality in the City of São Paulo (Desigualdades sociais e mortalidade Covid-19 na cidade de São Paulo), que analisou as mortes ocorridas na capital paulista entre março e setembro de 2020. De acordo com o estudo, conforme diminuem os indicadores socioeconômicos, como o acesso à educação e a renda, aumentam os riscos de morte por Covid-19. Para além do dinheiro, a cor da pele é o fator mais preponderante para o risco de perder a vida por causa do Sars-CoV-2, uma vez que entre pretos e pardos as taxas de mortalidade são 81% e 45%, respectivamente, mais altas que as de pessoas brancas.

Publicado em 28 de fevereiro deste ano, no International Journal of Epidemiology, da Oxford Academic, o estudo usou dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade da cidade de São Paulo. O sistema registra todas os óbitos acontecidos no município, com informações sobre idade, sexo, raça, distrito de residência, local e data de morte, tipo de administração da unidade de saúde (pública ou privada) e a causa da morte. Esses dados foram cruzados com os indicadores socioeconômicos dos locais de moradia dessas pessoas, o que permitiu aos pesquisadores entender como os contextos sociais podem influenciar na eficiência do combate à Covid-19.

Os números mostram a relação entre o nível de escolaridade e o risco de morrer por Covid. Na população jovem e adulta, entre aqueles que vivem em áreas com menor percentual da população com curso superior, a mortalidade foi quatro vezes maior em comparação com o grupo que mora em áreas mais escolarizadas. Isso pode ser consequência da exposição maior ao vírus devido à ida ao trabalho, o uso de meios de transporte e a alta incidência de comorbidade entre pessoas com menos escolaridade.

A desigualdade sempre existiu, a pandemia só veio para escancarar isso. E quando a gente fala da diferença racial, aí que o abismo fica ainda maior“, diz Karina Ribeiro, professora e pesquisadora do departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, que liderou o estudo. “A heterogeneidade em altas taxas de morbidade e mortalidade de Covid-19 está frequentemente associada à estrutura de saúde de um país e à desigualdade social, por isso esses dados repetem os abismos sociais do Brasil.”

O estudo comprova uma associação direta entre raça e local de morte. Enquanto os asiáticos foram o grupo com maior percentual de óbitos domiciliares, os negros (soma dos pretos e pardos) apresentaram os maiores percentuais de óbitos em unidades de saúde que não hospitais, ou seja, unidades básicas de saúde. Além disso, três em cada quatro os negros morreram em instituições públicas; já brancos (49,4%) e asiáticos (72,2%) morreram mais frequentemente em unidades de saúde privadas ou sem fins lucrativos. Isso pode estar relacionado com as barreiras no acesso à saúde. A cidade de São Paulo possui 4,09 leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) por 10 mil habitantes, mas essa taxa é de 5,27 no setor privado e apenas 1,58 para o Sistema Único de Saúde (SUS).

Os impactos da desigualdade social na letalidade da doença também ficam claros na comparação entre os distritos com a maior e a menor taxa de mortalidade. O Brás, bairro de classe média conhecido pelo comércio de roupas na região central de São Paulo, registrou 192,3 óbitos por 100 mil habitantes, número quase quatro vezes o verificado no Jardim Paulista, bairro de elite, cuja taxa foi de 48,1 óbitos por 100 mil habitantes. Na capital paulista como um todo, o índice foi de 123,2 óbitos/100 mil habitantes “Não é que as pessoas mais ricas não se infectam ou morrem, o que acontece é que elas têm mais recursos à disposição que ajudam para que a mortalidade nesse grupo social seja menor”, apontou Ribeiro.

De acordo com a pesquisa, em áreas ricas, a desigualdade entre brancos e negros aumenta. É esse segundo grupo que morre mais. Quando moram nesses bairros, os negros residem no trabalho, como empregados domésticos, mas o acesso deles à saúde não é igual, e suas condições de vida não são as mesmas. “O empregado não tem o mesmo tratamento de saúde do patrão, ele habita aquele lugar, mas não pertence a ele. É a questão racial se mostrando mais forte que as demais. A diferenciação racial vai aumentando conforme aumenta a renda.”

Um outro dado que chamou a atenção da pesquisadora foi a diferença entre homens e mulheres quando o assunto é risco de morte por Covid-19. O levantamento aponta que, em todas as idades, pessoas do gênero masculino têm 84% mais risco de morrer do que as do gênero feminino. A ciência ainda não consegue cravar o porquê disso, mas alguns fatores podem explicar a disparidade, como hormônios sexuais, diferenças no estilo de vida que podem resultar nos homens maiores comorbidades, diferenças na exposição ao Sars-CoV-2 devido a fatores comportamentais e ocupacionais ou consciência dos sintomas e adesão às medidas preventivas de saúde.

As desigualdades apontadas pelo estudo poderiam ser ainda maiores se os indicadores socioeconômicos utilizados tivessem sido colhidos de cada uma das 19,5 mil pessoas que morreram no período estudado. Porém, ainda que o sistema de registro de óbito paulistano seja um dos mais completos e ágeis do Brasil, essas informações não estavam disponíveis. Mesmo assim, entendem os pesquisadores, é possível imaginar que as conclusões podem servir como parâmetro para entender a dinâmica das mortes por Covid em todo o país. “Esses resultados, ainda que sejam específicos da cidade de São Paulo, podem ser usados para se ter uma noção do que acontece em outras grandes cidades. Existe, inclusive, a possibilidade que os índices de desigualdade sejam ainda piores fora da capital paulista”, diz. 

No fim do período estudado, houve uma tendência de diminuição na mortalidade em todos os grupos raciais, que começou mais cedo entre brancos e asiáticos, em comparação com pretos. Uma explicação possível para isso é a dificuldade em implementar medidas de distanciamento social e higiene adequada em áreas com alta vulnerabilidade social devido à aglomeração familiar e às precárias condições de vida.

Com o recrudescimento da pandemia e os recordes diários de mortes por conta da Covid-19, a tendência de mortes deve se repetir. “A direção para que se aponta é quase a mesma de quando começamos o estudo, só que mais acelerada. Nada foi feito para mudar essa tendência, pelo contrário. Houve um desincentivo às medidas protetivas e isso impacta fortemente nas camadas menos favorecidas”, avaliou Ribeiro. Para a pesquisadora, a politização da pandemia sabotou o sistema de saúde e o programa de vacinações. “O que aconteceu no Brasil foi uma esculhambação geral, principalmente por parte do governo federal. A negação da ciência e a descrença no perigo da Covid-19 todos os dias desorientam a população e levam ao caos que estamos vendo.”.

08mar2021_13h23

MARCOS AMOROZO (siga @marcosamrz no Twitter)

Estagiário de jornalismo na Piauí, é estudante da Universidade de Brasília (UnB)

  Reportagem Revista Piauí.



sábado, 24 de abril de 2021

Entrevista sensacional de Jalil Abdul Muntaqim ex-membro do Partido dos Panteras Negras (BPP) e do Exército de Libertação Negra (BLA) a Breno Altman do OPERAMUNDI

Sábado dia 24/04/2011 as 11hs (horário do Brasil), os internautas e  seguidores do OPERAMUNDI, Canal do Yuotube apresentado e comandado por Breno Altman, foram agraciados pela sensacional entrevista com Jalil Abdul Muntaqim,  ex-membro do Partido dos Panteras Negras, que teve sua liberdade concedida pela justiça Americana (EUA) após cinquenta (49) anos de prisão.



Jalil Abdul Muntaqim (nascido Anthony Jalil Bottom em 18 de outubro de 1951) é um ex-membro do Partido dos Panteras Negras (BPP) e do Exército de Libertação Negra (BLA). Em agosto de 1971, ele foi preso na Califórnia junto com Albert “Nuh” Washington e Herman Bell e foi acusado do assassinato de dois policiais da NYPD , Waverly Jones e Joseph A. Piagentini, na cidade de Nova York em 21 de maio. Em 1974, ele foi condenado por duas acusações de homicídio de primeiro grau e sentenciado à prisão perpétua com possível liberdade condicional após 22 anos. Muntaqim tem sido objeto de atenção por ter sido repetidamente negado à liberdade condicional, apesar de ser elegível desde 1993. Em junho de 2020, Muntaqim estava supostamente doente por corona vírus.  Ele foi libertado da prisão em 7 de outubro de 2020, após mais de 49 anos de prisão e 11 negações de liberdade condicional. 


Outras fontes: https://en.wikipedia.org/wiki/Jalil_Muntaqim