Arquivo Frente Brasil Popular MG *Dandara Tonantzin é pedagoga, mestranda em educação e vereadora pelo PT em Uberlândia -MG
A história oficial nos
conta que no dia 13 de maio de 1888 a “benevolente” princesa Isabel assinou a
Lei Áurea, salvando o povo negro dos horrores da escravidão. O que não consta
nos livros tradicionais é que a abolição foi fruto de muita luta de nossos antepassados,
que resistiram com fugas organizadas dos cativeiros, rebeliões, quilombos e
lutas abolicionistas. De salvadora a princesa branca não teve nada; a lei foi
assinada por pressão econômica internacional inglesa que desde 1845 proibia o
tráfico negreiro.
Cerca de 4,8 milhões de
africanos foram sequestrados de suas famílias e encarcerados em navios
tumbeiros para o Brasil. O trajeto era desumano e a vida dos sobreviventes era
rodeada de perversidade. Latifúndios eram campos de concentração onde pessoas
escravizadas eram tratadas pior que animais de carga. Apesar de tanta dor,
sobrevivemos e construímos esse país à sangue e suor. A contribuição que demos
para a construção da pátria ainda é negada. Ainda aparecemos nos livros de
história somente nas páginas que remetem ao crime da escravidão.
Somos bisnetos (as) de
guerreiros e guerreiras, que saíram da escravidão sem reparação alguma, sem
direitos à terra, à educação ou moradia. Sem perspectivas, o povo negro começou
a habitar as periferias ao redor dos centros urbanos que se formavam. No dia
14, após a lei de abolição, o que restou para nós?
Por isso hoje não
comemoramos a falsa abolição, chancelada pelo viés branco. Hoje exigimos
respeito e igualdade, mesmo que tardia. A escravidão deixou marcas na nossa história.
No momento em que nascia o Brasil, a escravidão era mais do que somente um
modelo econômico, era um sistema político, cultural, social, que constituiu
valores, que organizou geopoliticamente as cidades, determinou lugares e não
lugares. O preconceito racial se enraizou de tal maneira em nossa sociedade que
o racismo se tornou estrutural, presente nos discursos de ódio da internet, nas
piadinhas sobre o cabelo ou traços afros, na ausência de pessoas negras em
cargos de liderança e espaços de poder.
Hoje, negros são 79,1%
das vítimas de intervenções policiais que resultam em morte, de acordo com o
Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2020. Somos também 66,7% dos
encarcerados nas prisões brasileiras. Durante a pandemia de Covid-19 morreram
40% mais pretos e pardos do que brancos.
A chacina de
Jacarezinho, no dia 06 de maio, nos lembra que os fantasmas da escravidão
seguem os passos de cada pessoa negra nesse país: Na desvalorização, no medo,
na perseguição, na fome, nos estigmas, na bala perdida que sempre encontra o
corpo negro. Nossa cor de pele é alvo. Nossa cultura, nossos ritmos, nossa fé.
No dia 13 de maio de
2021 são milhares de mães pretas que velam seus filhos assassinados,
desaparecidos, crimes que nunca tiveram justiça. Miguel Santana, Clayton da
Silva Freitas Lima, Cláudia Silva Ferreira, Ray Pinto Faria, Jenifer Gomes e
tantos mais. Se tornaram vítimas de sistema cruel, onde o preto é suspeito e
nossas lágrimas não importam.
Temos pressa para que as
coisas mudem. Já são 133 anos de um grito preso na garganta. Diferente do que
canta o hino nacional, o sol da liberdade não raiou para todos (as) nós. É
cansativo ainda lutarmos pela quebra das correntes do racismo.
Ocupamos espaços
importes, por exemplo, sou uma mulher negra na Câmara de Vereadores de
Uberlândia. Olho para o lado e vejo os herdeiros da casa grande até hoje no
poder. Não toleram a nossa presença, incomodamos. Nada para o povo preto foi de
graça, ou por acaso. A libertação nunca bateu na nossa porta. Tudo foi, tudo
será: LUTA.
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