A dificuldade e os tabus em torno do câncer de mama em homens muitas vezes estão relacionados à falta de informação e à percepção equivocada de que se trata exclusivamente de uma doença feminina. Isso pode levar a diagnósticos tardios e, consequentemente, a um tratamento mais complexo.
Portanto, vamos juntos nessa luta contra o câncer de mama. Homens também podem ser afetados e têm um papel importante na conscientização sobre essa doença.
É uma das principais causas de morte entre as mulheres em todo o mundo, e infelizmente, as mulheres negras são desproporcionalmente afetadas por essa doença. Apesar de todos os avanços no diagnóstico e tratamento do câncer de mama, as mulheres negras ainda enfrentam dificuldades significativas nesse contexto, tanto em relação ao diagnóstico precoce quanto ao acesso adequado ao tratamento. Essas dificuldades têm raiz em um problema mais amplo:
o racismo estrutural presente na sociedade brasileira.
Dados estatísticos comprovam que as mulheres negras apresentam maiores taxas de mortalidade por câncer de mama em comparação com as mulheres brancas. Essa discrepância se deve a várias razões, entre elas, a dificuldade no diagnóstico precoce. Segundo o IBGE1, as mulheres negras têm menos acesso aos serviços de saúde e realizam menos exames preventivos do que as mulheres brancas. Além disso, o IPEA2 aponta que as mulheres negras têm menor renda, escolaridade e condições de trabalho do que as mulheres brancas, o que dificulta a busca por tratamento adequado e a adesão às terapias.
Outro fator que contribui para a maior mortalidade por câncer de mama entre as mulheres negras é a falta de representatividade nas campanhas de conscientização e nas pesquisas científicas sobre a doença. Segundo o Instituto Oncoguia3, as mulheres negras são quase invisíveis nas campanhas sobre câncer de mama, que geralmente retratam mulheres brancas e jovens. Essa invisibilidade pode gerar desinformação, estigma e baixa autoestima nas mulheres negras, que podem se sentir excluídas e desvalorizadas. Além disso, as pesquisas científicas sobre o câncer de mama também são escassas em relação às especificidades das mulheres negras, que podem apresentar diferenças biológicas, genéticas e ambientais que influenciam na incidência e na resposta ao tratamento da doença.
Diante desse cenário, é fundamental que sejam adotadas políticas públicas afirmativas de promoção da igualdade étnico-racial e da proteção dos direitos das mulheres negras com câncer de mama. Essas políticas devem envolver a ampliação do acesso aos serviços de saúde, a garantia da qualidade do atendimento, a diversificação das campanhas de conscientização, o incentivo à participação das mulheres negras nas pesquisas científicas e o combate ao racismo institucional e à discriminação nos espaços de saúde. Além disso, é importante que sejam fortalecidas as redes de apoio e acolhimento às mulheres negras com câncer de mama, como as entidades voltadas a temáticas étnico-raciais, que podem oferecer suporte emocional, social e jurídico às pacientes.
Jucelio Franco
Coordenador do INSTITUTO AGONTINMÊ e do COLETIVO HOMENS, FALANDO DE SUA SAÚDE.
Esses incidentes são uma clara violação dos direitos humanos e da liberdade religiosa. É crucial que haja uma maior conscientização sobre essas questões e que sejam tomadas medidas para proteger essas comunidades e garantir que elas possam praticar suas crenças livremente. A luta contra a intolerância religiosa é uma responsabilidade coletiva e requer o compromisso de todos nós.
Jucelio Franco.
Coordenador do Instituto Agontinmê e do Coletivo Homem, Falando de Sua Saúde.
A saúde mental da população negra no Brasil é afetada de forma significativa por uma série de fatores, como o racismo estrutural, a desigualdade gritante, o sistema de saúde pública carente de investimentos e uma elite preguiçosa, predominantemente de extrema direita, além dos bolsões de pobreza e da violência policial. Dados do IPEA, do IBGE e do Fórum de Segurança Pública, assim como pesquisas sobre população negra e saúde mental no Brasil, apontam para a urgente necessidade de atenção e políticas públicas efetivas para lidar com essa questão.
O racismo estrutural é uma realidade presente na sociedade brasileira, perpetuando-se por gerações e impactando a saúde mental da população negra. A discriminação racial, tanto explícita quanto velada, gera um ambiente hostil que afeta a autoestima, a autoconfiança e a identidade negra, resultando em altos níveis de estresse e ansiedade. Além disso, o racismo também está presente nas instituições de saúde, prejudicando o acesso adequado a tratamentos psicológicos e psiquiátricos.
A desigualdade social no Brasil é outra questão que afeta diretamente a saúde mental da população negra. A falta de oportunidades em termos de educação, emprego e renda contribui para um ambiente de instabilidade e insegurança, aumentando a vulnerabilidade emocional e psicológica. A precariedade das condições de vida, como habitação inadequada e falta de acesso a serviços básicos, também exerce um papel negativo na saúde mental dessa população.
O sistema de saúde pública brasileiro, já carente de investimentos, muitas vezes falha em atender às necessidades específicas da população negra. A falta de profissionais capacitados para atender às demandas culturais e étnicas dessa população, assim como a escassez de serviços especializados em saúde mental, impede um atendimento adequado e eficiente. Dessa forma, muitas pessoas negras acabam sem acesso aos cuidados necessários, agravando ainda mais suas condições de saúde mental.
A presença de uma elite preguiçosa, predominantemente de extrema direita, que ignora ou minimiza os problemas enfrentados pela população negra, também contribui para a deterioração da saúde mental. A falta de políticas públicas que visem à redução da desigualdade e à promoção da igualdade racial cria um ambiente favorável ao desenvolvimento de transtornos psicológicos, como a depressão e a ansiedade. A ausência de uma rede de apoio adequada faz com que as pessoas negras enfrentem dificuldades em superar esses problemas.
Ademais, os bolsões de pobreza e a violência policial também têm um impacto significativo na saúde mental da população negra. A concentração de pessoas negras em áreas de alta vulnerabilidade socioeconômica e a exposição constante à violência contribuem para o aparecimento de transtornos mentais. Além disso, a violência policial, que afeta desproporcionalmente as pessoas negras, causa traumas e estresses que podem levar ao desenvolvimento de doenças psíquicas.
Diante dessas evidências, é fundamental que sejam implementadas políticas públicas que visem à promoção da saúde mental da população negra. É necessário investir na formação de profissionais de saúde capacitados para atender às demandas específicas dessa população, além de disponibilizar serviços especializados e de qualidade. Medidas para reduzir a desigualdade e promover a igualdade racial também devem ser adotadas, a fim de criar condições propícias para o bem-estar mental da população negra.
A saúde mental da população negra no Brasil é um desafio urgente que requer uma abordagem ampla e estrutural. É preciso reconhecer e enfrentar o racismo estrutural, promover a igualdade de oportunidades, investir em políticas públicas efetivas e garantir o acesso universal e equitativo aos cuidados de saúde mental. Somente assim será possível reduzir as disparidades e garantir uma sociedade mais saudável e justa para todos.
A
saúde do homem negro brasileiro em um país marcado pelo racismo estrutural é um
tema complexo e urgente que merece toda a nossa atenção. De acordo com dados do
IBGE, os negros representam a maioria da população brasileira, sendo 56% do
total, porém, enfrentam inúmeras desigualdades sociais, econômicas e,
principalmente, na área da saúde.
Desde
os tempos da escravidão, o homem negro no Brasil foi submetido a condições
degradantes, trabalho exaustivo e violência constante. Essa realidade histórica
deixou marcas profundas na saúde dessa população, que até os dias atuais
enfrenta altos índices de morte precoce, doenças crônicas e agravamento de
problemas de saúde.
O
Sistema Único de Saúde (SUS) deveria ser a principal porta de acesso à saúde
para todos os brasileiros, no entanto, evidências mostram que as políticas de
saúde não contemplam as necessidades específicas do homem negro. Pesquisas
revelam que eles têm menor expectativa de vida, maior índice de doenças
cardiovasculares, diabetes, hipertensão e câncer, em comparação com outros
grupos étnicos.
Outro
grave problema enfrentado pelo homem negro é a violência. Dados do Atlas da
Violência mostram que a taxa de homicídios entre jovens negros é muito superior
à de jovens brancos. Essa violência também afeta diretamente a saúde mental,
resultando em traumas, ansiedade e depressão.
Diante
dessa realidade, questionamos o descaso e a falta de políticas públicas
efetivas voltadas para a saúde do homem negro. É inadmissível que em um país
que se denomina democrático, ainda existam tantas desigualdades raciais na área
da saúde.
Como
afirmou o geógrafo Nilton Santos, "Onde há racismo, não há
democracia". Precisamos urgentemente desconstruir esse sistema estrutural
de racismo e garantir o direito à saúde de todos os brasileiros, incluindo o
homem negro. É fundamental que sejam desenvolvidas políticas públicas e ações
afirmativas que levem em consideração as particularidades dessa população,
promovendo acesso igualitário aos serviços de saúde e garantindo uma vida digna
para todos.
Jucelio
Franco
Coordenador
do Instituto Agontinmê
e
Coordenador Estadual do Coletivo Homem Falando de Sua Saúde
Nesses 80 anos da minha vida, eu nunca vi ninguém ousar tanto com uma frase que eu nem quero repetir aqui!Credito da imagem:
Pablo Valadares / Câmara dos Deputados
A deputada Benedita da Silva (PT-RJ) foi ao Plenário da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (29) denunciar um caso de violência política e insultos racistas feitos contra ela na quinta-feira (24) em um guichê do aeroporto de Brasília.
“Na quinta-feira, eu fui hostilizada no aeroporto. Nesses 80 anos da minha vida, eu nunca vi ninguém ousar tanto com uma frase que eu nem quero repetir aqui! Foi uma coisa violenta, e todos ficaram pasmos de ver!”, afirmou a deputada, que também condenou ataques sofridos recentemente pelo artista Gilberto Gil no Catar.
O agressor, segundo ela, estava acompanhado da mulher e dos filhos enquanto proferia insultos. “Eu, no guichê, não fazia nada ali a não ser ver a passagem para a troca do meu voo, e ele saiu de onde estava, acompanhado de mulher e filhos, e teve a coragem de me maltratar verbalmente, querendo que eu ficasse ali humilhada. Mas eu fiquei de cabeça erguida, porque eu não sou uma pessoa odiosa”, disse.
Discursos em Plenário
O deputado Charles Fernandes (PSD-BA), que presidia a sessão durante o pronunciamento de Benedita da Silva, afirmou que a Casa lamenta e repudia qualquer tipo de ação de violência contra parlamentares. “Os parlamentares foram eleitos de forma democrática e aqui representam os seus estados, representam o seu povo. Nós queremos que todos tenham respeito”, disse.
A parlamentar recebeu solidariedade de colegas de vários partidos. O deputado Luiz Lima (PL-RJ), defensor do presidente Jair Bolsonaro, afirmou que as divergências políticas sempre foram tratadas com respeito.
“Eu repudio qualquer ação que venha contra uma senhora que há muito tempo está na vida política. Repito, mesmo tendo divergências políticas, sua excelência tem qualidades. Ela é uma mãe, ela é uma avó, ela é uma bisavó”, disse.
O deputado Vicentinho (PT-SP) também defendeu a deputada Benedita da Silva, a quem se referiu como “minha irmã”. “Benê, você é nossa companheira de todas as horas. Você é uma imagem que dá tanto orgulho para o Brasil que, ao ser atingida, também nos sentimos atingidos. Você mesma é daquelas que diz que não devemos soltar a mão de ninguém. Agora nós estamos de mãos juntas, muito solidários”, declarou.
O livro “Dançando na mira da ditadura: bailes soul e violência contra a população negra nos anos 1970” vai mostrar como a juventude negra foi alvo de violações durante o regime militar. A obra foi escrita por Lucas Pedretti, o historiador que encontrou o dossiê usado para prender Caetano Veloso, ponto de partida do filme “Narciso em férias”.
Entre diversos documentos e situações, Pedretti narra como Tony Tornado foi alvo do Centro de Informações do Exército durante o 5º Festival Internacional da Canção, em 1970. No documento intitulado
“Flávio Cavalcanti, Tony Tornado e Danuza Leão tentam suscitar o problema da discriminação racial no Brasil”, os militares relatam que Tony importou o “gesto-símbolo do
‘poder negro’ (comunista)”.
Organização de Sasha Johnson, o Taking The Initiative Party, revelou que inglesa recebeu inúmeras ameaças de morte.
O partido Taking the Initiative revelou que Sasha Johnson, uma das principais ativistas do movimento Black Lives Matter no Reino Unido e que ficou conhecida como a Pantera Negra de Ofxord,
está internada em estado grave na UTI depois de ser "brutalmente atacada" na madrugada de domingo. O grupo alega que o ataque, ocorrido em Southwark, no sul de Londres, ocorreu após "inúmeras
ameaças de morte".
Sasha foi baleada na cabeça na madrugada de domingo perto de uma festa em Londres, quando estava ao lado de alguns de seus apoiadores, que insistem que o atentado foi "o
resultado de seu ativismo". No entanto, a Polícia Metropolitana insiste que não há nada que sugira que tenha sido um ataque direcionado ou que a vítima tenha recebido ameaças confiáveis
contra ela antes do tiroteio, por volta das três da manhã de ontem.
Os policiais disseram que a mulher foi levada a um hospital no sul de Londres com ferimentos fatais e abordaram testemunhas atrás de depoimentos
para descobrir quem teria efetuado o disparo. Detetives do Comando de Especialistas em Crimes do Met estão conduzindo investigações no local e na área ao redor e estão abordando diferentes
linhas de investigação.
Em depoimento, um representante da polícia afirmou: "Este foi um incidente chocante que deixou uma jovem com ferimentos muito graves. Nossos pensamentos estão com
sua família, que está recebendo apoio neste momento terrivelmente difícil". "Se você viu algo suspeito na área da Consort Road nas primeiras horas da manhã de domingo
ou se ouviu informações que desde então poderiam ajudar os detetives, é fundamental que você entre em contato", continuou o investigador.
Sasha, mãe de dois filhos e formada pela Oxford Brookes University, tem sido uma figura importante no movimento Black Lives Matter no Reino Unido e é membro do comitê
de liderança do Taking the Initiative Party. Em comunicado oficial, a organização escreveu: "Sasha sempre lutou ativamente pelos negros e pelas injustiças que cercam a comunidade negra, além
de ser membro do BLM e do Comitê de Liderança Executiva do Taking the Initiative Party. Sasha também é mãe de dois filhos e uma voz forte e poderosa para nosso povo e nossa comunidade. Vamos
todos nos reunir e orar por Sasha, orar por sua recuperação e mostrar nosso apoio a sua família e entes queridos".
Uma garota em um parque em São Paulo nesta quinta-feira. Mais da metade dos estupros no Brasil são contra menores de 13 anos. LELA BELTRÃ
Reportagem em áudio no final da pagina:
Mais
de 5.300 menores de 13 anos no Brasil denunciaram abusos sexuais em 2019. A
ponta do iceberg, pois considera apenas o que chega aos ouvidos da polícia
Geralmente são notícias
curtas na imprensa local. “Um homem e uma mulher foram presos pelo estupro de
uma menina de 13 anos. O delegado explica que o homem, casado com uma tia da
vítima, a estuprou durante seis anos. Os fatos eram do conhecimento da mãe e da
avó”. As prisões aconteceram na quarta-feira, 5 de maio, em Pinheiros, cidade
de 77.000 habitantes no Norte do Brasil. Nem a idade da vítima nem as circunstâncias
são algo excepcional. Informação anódina que narra crimes cotidianos. As estatísticas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) são chocantes. A
cada hora, quatro meninas menores de 13 anos são estupradas no Brasil, de
acordo com os números mais recentes. Mais da metade das 5.636 vítimas em 2019
tinha menos de 13 anos.
E isto é apenas a ponta
do iceberg, pois considera apenas o que chega aos ouvidos da polícia ou dos
serviços de saúde. “A violência sexual contra crianças está envolvida por um
pacto de silêncio”, enfatiza Márcia Bonifácio, chefe de uma equipe de
psicólogos e psicopedagogos da Prefeitura Municipal de São Paulo que apoia as
escolas quando surge um aluno problemático. Seu comportamento muitas vezes
esconde que é vítima de violência sexual ou de algum outro tipo.
Três brasileiras, a
educadora Bonifácio, a promotora Renata Rivitti e a diretora do Instituto Liberta,
Luciana Temer, usam sua vasta experiência para ajudar a entender os contornos
desse crime tão arraigado nesta cultura patriarcal e machista repleta de tabus
que, ao mesmo tempo, promove a sexualização precoce. “É um círculo muito
perverso com poucos finais felizes”, diz Bonifácio.
A vítima pode ser uma
menina de quatro anos que se masturba quatro vezes ao dia na aula, uma garota
de 10 anos que começa a mostrar a figura de uma mulher grávida, um menino de
sete anos que obriga seus colegas a fazer sexo oral, uma adolescente aplicada e
retraída que aparece com um olho roxo e oferece explicações pouco credíveis...
As vítimas não seguem um padrão. Os agressores sim: “Não tenho notícias de
nenhum caso em que a agressão tenha sido perpetrada por um estranho”, diz
Bonifácio. Geralmente pertence ao entorno familiar. O pai, o padrasto, irmãos
mais velhos, tios, avós, amigos da família...
Aqueles que combatem a
violência sexual contra as crianças insistem em como ela é democrática. No muito desigual Brasil, não diferencia raças ou classe social. A Unicef estima
que 120 milhões de mulheres tiveram um contato sexual indesejado antes dos 20
anos.
O Código Penal Brasileiro considera estupro de pessoa vulnerável manter relações carnais ou
praticar qualquer ato libidinoso com menor de 14 anos. As agressões podem
começar muito cedo e durar muitos anos. Não é rara a cumplicidade da mãe ou de
outros parentes, nem que a vítima seja responsabilizada por destruir a família
ou deixá-la sem amparo quando o agressor é quem traz o dinheiro para casa.
Costuma ser um processo in crescendo, no qual os abusos são cada vez mais
invasivos, mas sutis. Muitas vezes não deixam marcas.
Márcia Andrea Bonifácio
lidera uma equipe de apoio às escolas que detectam casos de violência sexual.
LELA BELTRÃO
“Quando têm entre zero e
seis anos, as vítimas têm pouco repertório, podem até perceber isso como uma
brincadeira, como uma demonstração de carinho, sentem prazer, não têm
parâmetros e é muito comum o agressor exigir que guardem o segredo”, explica a
promotora Rivitti. Elas são pequenas demais para distinguir o que é certo e o
que não é. Uma dificuldade que não depende apenas da idade. Bonifácio, cuja
equipe se chama Núcleo de Apoio e Acompanhamento para a Aprendizagem, lembra o
caso de uma adolescente de 13 anos de uma família evangélica que descobriu em
uma aula de ciências que aquilo que o pai fazia com ela desde que com oito
menstruou pela primeira vez era sexo. Aquela garota não tinha televisão,
celular ou internet. Por isso, diz a promotora, as aulas de educação sexual são
tão importantes.
Os casos mais graves vêm
à tona em um hospital
Detectar o abuso é o primeiro passo. Quando são pequenos, geralmente se descobre pelo comportamento
na escola. Se forem mais velhos, contam a alguém de confiança. Os casos mais
graves vêm à tona em um hospital.
Descobrir o abuso não é
fácil, proteger a vítima sem minimizá-la, tampouco. E perseguir o crime, menos
ainda. A promotora Rivitti afirma que levar a vítima para um abrigo deve ser o
último recurso. Grande é o risco do que chamam de violência institucional. Se
depois de peregrinar por diferentes serviços para repetir seu primeiro relato
perante o conselho tutelar, a polícia, o hospital, submetendo-se a uma
avalanche de perguntas e um minucioso exame pericial, a menina acaba longe de
seus parentes, de seu bairro, de sua escola e de seus amigos, ela se culpa. Diz
‘minha boca está amaldiçoada, eu falei e me castigaram’.” Algumas se desmentem
porque o preço que pagam por revelar o abuso não lhes compensa.
“Temos que dar
informações às vítimas para que entendam o que é o abuso, para que saibam
relatá-lo e temos que dar crédito ao que dizem”, insiste a promotora Rivitti.
Isso é um começo. Depois tentam identificar um membro da família para proteger
a menina em casa e afastar o estuprador. Se ele é fonte de renda, tentam buscar
ajuda financeira.
E a punição aos
agressores? Conseguir um caso suficientemente sólido para ser levado ao juiz é
outra grande dificuldade. Geralmente é a palavra da criança contra o adulto. O
pior pesadelo de quem combate o estupro infantil é que o tribunal absolva o
acusado. “Não podemos entregar o cordeiro ao lobo com aval judicial”, alerta a
promotora.
Apesar da complexidade
do desafio, cada uma das três lutas em uma frente para que na próxima hora
quatro brasileiras menores de 13 anos não sejam estupradas. Temer o faz à frente
do Instituto Liberta, com documentários como Um crime entre nós, com o qual
busca sensibilizar, romper “o círculo perverso da normalização do abuso”. Entre
os recrutados para a missão, um dos homens mais famosos do Brasil, o
apresentador da Rede Globo Luciano Huck, cujo nome é citado como candidato à
presidência.
A promotora Rivitti
tenta replicar no Estado de São Paulo o modelo que criou em Jacareí, cidade de
235.000 habitantes do interior, onde através da coordenação dos serviços
educacionais, sociais e de saúde conseguiu proteger melhor as vítimas, o que
levou a mais denúncias, menores testemunhas em julgamentos e mais condenações.
Ela trabalha com uma rede de 70 outros promotores.
Com as escolas fechadas
durante meses devido à pandemia, a equipe liderada por Bonifácio abriu novos
canais para os alunos lançarem um SOS. Criou um site que canalizou as denúncias
de 200 casos de violência em nove meses. Destes, 56 eram de violência sexual.
Em conversa com o Papo de Mãe, a coordenadora do
programa "Racismo e Bullying", Natália Carneiro, nos conta sobre a
série no Instagram.
A série “Racismo e
Bullying: como proteger jovens negras?” surgiu de uma parceria do Geledés,
Instagram e da ONG SaferNet, com ilustrações de Bruna Bandeira e direção de Day
Rodrigues. O Geledés - Instituto da Mulher Negra foi criado em 30 de abril de
1988. É uma organização política de mulheres negras que tem por missão
institucional a luta contra o racismo e o sexíssimo, a valorização e promoção das
mulheres negras, em particular, e da comunidade negra em geral.
Lançada na última
sexta-feira (07), a série tem três episódios em formato de ilustração sobre
Guta, uma menina negra de 13 anos que sonha em ser cineasta. “A gente queria
trabalhar com uma menina livre, que gostasse de si mesma e muito bem resolvida
com as questões raciais dela, para poder passar isso para outras meninas. Que
representasse todas as meninas negras dentro dessa faixa etária a partir dos 13
anos de idade”, diz Natália Carneiro, 29, coordenadora do Programa Institucional de Geledés.
O projeto teve início no
final de 2019, em um longo processo para entender quais eram as necessidades da
pauta dos direitos das jovens negras, tendo um enfoque na evasão escolar e no
diálogo sobre o bullying. “Muitas vezes o racismo é tido como bullying, e a
gente precisa diferenciar o que é racismo e o que é bullying, como afeta a
criança negra de maneiras e perspectivas diferentes”, observa a coordenadora.
Segundo o Observatório
da Educação, existe uma idade crítica para a evasão escolar no Brasil. No
ensino fundamental, com mais ou menos 13 anos de idade, a proporção de jovens
na escola chega a 97%. Essa proporção cai quando se trata de jovens de 16, 17 e
18 anos. O último levantamento feito pelo IBGE traz números alarmantes: das 50
milhões de pessoas com idades entre 14 e 29 anos, 20% delas não tinham
terminado alguma etapa da educação básica.
Natália conta que apesar
de recente, o projeto tem sido procurado por muitos educadores que entendem a
importância do tema dentro da sala de aula: “Inicialmente achamos que o projeto
ficaria somente no âmbito da internet, mas logo no lançamento do teaser
(chamada), vários professores nos enviaram mensagens perguntando como aplicar
aquilo em sala de aula”. A importância dessa ponte entre quem está consumindo o
Instagram e a faixa etária para quem a Guta pode conversar é enorme, já que o
Instagram só permite perfis a partir da idade mínima de 13 anos.
Ao término da série, ela
ficará disponível no Portal Geledés como material para quem quiser utilizar.
Ficou interessado? O
primeiro episódio já está no ar, confira no Instagram do Geledés.
Onze estados não
fornecem as informações das vítimas das duas polícias. Mesmo entre os que
coletam os números, há vários casos de ‘raça não informada’. Dados divulgados
revelam que quase 4 em cada 5 mortos são negros.
Os estados brasileiros
não sabem ou não informam a raça de mais de 1/3 das pessoas mortas pela polícia
em 2020. Ao menos 11 unidades da federação não passam nenhum tipo de informação
sobre a raça/cor da pele das vítimas das duas corporações (polícias Militar e
Civil). Mesmo entre os que coletam e disponibilizam os dados, há vários casos
de “raça não informada”.
Considerando apenas os
casos em que a raça é divulgada, os números revelam que 78% dos mortos pelas
polícias são negros.
É o que mostra um
levantamento exclusivo feito pelo G1 dentro do Monitor da Violência, uma
parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Núcleo de Estudos da
Violência da USP.
Falta transparência na divulgação da raça de mortos pela polícia — Foto: Guilherme /G1
Os pedidos foram feitos
para as secretarias da Segurança Pública dos estados (e diretamente para as
corporações em alguns casos) por meio da Lei de Acesso à Informação e das
assessorias de imprensa. Foram solicitados os casos de “confrontos com civis ou
lesões não naturais com intencionalidade” envolvendo policiais na ativa.
Dez estados, porém, não
divulgam as mortes em confronto policial por raça, informação que também foi solicitada
pelo G1. Assim, com Goiás, são 11 os estados que não divulgam as informações
raciais de forma completa (de ambas as polícias). Eram 12 no último
levantamento, referente ao primeiro semestre do ano passado.
O levantamento mostra
que:
a raça de 2.064 das
5.660 pessoas mortas pela polícia em 2020 não é conhecida, ou seja, 36% do
total
11 estados não divulgam
os dados de raça das vítimas de ambas as polícias
das 3.596 vítimas para
as quais há a informação da raça, 2.815 são negras (78%)
Acre e Roraima são os
únicos estados que informam a raça de todas as vítimas mortas no ano
mesmo entre os estados
que coletam os dados, 1.013 vítimas aparecem como raça “não informada” ou
“desconhecida”
Falta de transparência
Para Felipe Freitas,
pesquisador do Grupo de Pesquisa em Criminologia da Universidade Estadual de
Feira de Santana, a falta de informações impede a construção de políticas
públicas democráticas na área da segurança.
“Nas áreas da saúde e da
educação, por exemplo, só foi possível avançar em uma agenda de enfrentamento
ao racismo à medida em que se qualificaram os instrumentos de registro das
informações, que permitiram identificar a desigualdade racial”, compara.
Além da não divulgação
dos dados, a falta de padronização chama a atenção. Há casos em que “albino”
foi considerado uma raça, por exemplo, sendo que o albinismo é uma doença, e
não uma categoria racial.
A referência é a
classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que
trabalha com as seguintes opções: branca, preta, parda, indígena ou amarela. Os
pardos e pretos compõem os negros.
Para superar essas
dificuldades, Freitas aponta que um dos caminhos é treinar as equipes da área
da segurança pública para perguntar e preencher a informação sobre sobre
raça/cor, assim como ocorreu nos serviços públicos de saúde.
“A área da saúde passou
quase dez anos investindo em formação para que eles aprendessem a, no
atendimento da atenção básica, perguntar qual a raça/cor dos pacientes. É
preciso desenvolver o processo de formação, corrigir os sistemas para não
permitir que se avance sem preencher essa informação e retirar as categorias
ignorado ou ‘não quis declarar’, que criam uma limitação estatística
gigantesca”, exemplifica.
Não houve nenhum caso
enquadrado como “indígena”, por exemplo, no levantamento do G1. Isso não quer
dizer que nenhuma pessoa indígena foi, de fato, morta pela polícia. Como não
existe uma padronização oficial de preenchimento, elas podem ter sido
categorizadas como pardas ou podem constar da categoria “não informado”.
Manifestantes erguem a bandeira do Black Lives Matter — Foto: Kerem Yucel/AFP
Por que a polícia mata
mais negros?
Para Felipe Feitas, o
racismo estrutural explica por que a polícia mata mais pessoas pretas e pardas.
“O peso das representações negativas e dos estereótipos em relação às pessoas
negras produz socialmente essa autorização para matá-las”, afirma.
No entanto, há questões
técnicas, relacionadas à dinâmica entre a polícia e o Judiciário, que
influenciam essa seletividade, diz.
“O modelo de policiamento brasileiro é
ostensivo, de grandes operações e de flagrante. E a atuação do policial na rua
é muito influenciada pelas práticas discriminatórias que estão presentes na
sociedade. Assim, há um alto grau de discricionariedade no contato com a
população. E o Judiciário é muito frágil em estabelecer balizas para a ação
policial”, explica Freitas.
Negros são 78% dos mortos pelas polícias no Brasil em 2020. — Foto: Elcio Horiuchi/G1
A diretora da Anistia
Internacional, Jurema Werneck, também aponta a responsabilidade do Judiciário e
do Executivo, principalmente dos governadores, nos assassinatos de negros
cometidos pelos agentes de estado.
“Não é só matar, é
deixar matar. O racismo na administração do estado também está contribuindo
para esse quadro”, afirma Jurema. “E esconder informação é uma estratégia para
continuar permitindo essa violação profunda dos direitos humanos das pessoas
negras no Brasil."
Como parte da solução,
Felipe Freitas aponta que, mais do que focar nas polícias, a sociedade civil
precisa pressionar outras instâncias de poder – o Ministério Público, por
exemplo, tem a função constitucional de controle externo das polícias.
“E não só para pensar se
o policial que age abusivamente está sendo punido ou não, mas que não se valide
o produto da ação policial que não é produzida legalmente. Isso é uma forma de
estimular uma conduta policial dentro da legalidade e, ao mesmo tempo, reprimir
a ação policial fora da legalidade”, diz Freitas.
Morte de George Floyd
Discussões sobre racismo
e raça ganharam destaque em todo o mundo capitaneadas principalmente pela onda
de protestos que tomou os Estados Unidos após a morte do ex-segurança negro
George Floyd por um policial em Minneapolis em 25 de maio do ano passado.
Manifestante segura cartaz com retrato de George Floyd durante protesto em Nova York — Foto: Angela Weiss/AFP
O americano morreu
asfixiado após ter o pescoço prensado pelo joelho do policial Derek Chauvin por
8 minutos e 46 segundos. Um vídeo que mostra o momento da sua morte circulou
pela internet, aumentando a visibilidade do caso e gerando indignação. Nos dias
seguintes, diversas cidades do país registraram protestos por conta da
violência policial cometida contra a população negra. Os atos ganharam o mundo
e ocorreram também no Brasil.
Os estados que não
divulgam as informações de raça têm explicações distintas para a falta de
transparência.
No Amazonas, por
exemplo, a Secretaria da Segurança Pública diz apenas que “os dados não são
coletados com esse detalhamento”.
Já em Minas Gerais, o
governo diz que “para elaboração dos dados são necessários trabalhos laboriosos
de análise, consolidação e tratamento” e, por isso, não tem condição de passar
as informações referentes à Polícia Militar.
No Pará, a justificativa
é que “a grande maioria [dos dados] não foi informada no momento do
preenchimento do boletim de ocorrência”. O estado, porém, não diz a raça de
nenhuma das vítimas.
O Núcleo de Análise
Criminal e Estatística da Secretaria da Segurança da Paraíba, por sua vez, diz
que, do mesmo modo como é feito pelo IBGE, o método de captação do dado de
raça/cor é a “auto declaração”. “Porém, como isso não é possível para as pessoas
mortas, na verificação estatística deste quesito utiliza-se o registro da
classificação inserida na Declaração de Óbito que compõe o Sistema de
Informação de Mortalidade do Datasus.”
“Esse é o documento
oficial, muito mais seguro e apropriado do que uma informação de um parente ou
de um policial que visualiza o corpo. Em razão disso, como se utiliza outra
fonte de dados para a verificação do quesito raça/cor, não é possível
desagregar esta variável para as outras classificações do banco de informações
oriundas das polícias utilizado pelo núcleo, a exemplo dos inquéritos
policiais, de onde vêm as informações para classificar o CVLI como feminicídio,
latrocínio, confronto policial, entre outros”, diz a secretaria.
No mês de maio as Casas de Umbanda festejam os Pretos Velhos. Já os Barracões de Candomblé, dividem-se. Uns, aderem aos festejos. Outros, fazem questão de rejeitar as comemorações, alegando inexistir culto aos Pretos Velhos na Liturgia africana. Acho mais do que pertinente lançar algumas ponderações a respeito.
Não resta sombra de dúvidas que o culto aos deuses africanos no Brasil (como já diferiam Pierre Verger e Roger Bastide) não é igual ao da África. E não foi apenas o Oceano Atlântico que proporcionou as distinções. Além da geografia, o tempo, a cultura, os aspectos sociais, os episódios históricos, os novos sentires, os novos olhares e a própria fauna e flora, contribuíram decisivamente para que várias alterações fossem realizadas no rito original. O que eu chamo de “releitura”. Nada engendrado, nem premeditado. Apenas ocorrido.
Todavia, adaptado ou não; relido ou não, a organização sócio-religiosa que nós chamamos de Candomblé só existe no Brasil graças aos negros africanos de diversas etnias e a seus descendentes. Graças a eles. À alma deles.
Naquela época, dizia-se que os “negros não tinham alma”. Mas hoje, há que se dizer: tinham, sim! Têm, sim! O Candomblé deve sua existência à alma deles! Dos “Pretos Velhos”, dos “Pretos Novos”, dos “Pretos”, dos velhos, dos novos. Negar a importância daqueles homens e mulheres sábios e briosos na formação do Candomblé, é negar novamente e preconceituosamente sua alma, seu espírito guerreiro, sua dignidade, sua força.
Os negros africanos chegaram nesta terra distante em condições precárias, despojados de sua liberdade, família, bens e costumes. Mas não abandonaram sua religiosidade.
Foram confinados em navios pútridos e em galpões inabitáveis. Separados dos seus, foram vendidos como animais em praça pública até serem finalmente jogados em senzalas onde eram misturados com outros desafortunados. Congoleses, angolanos, daomeanos, iorubanos, trabalhavam de sol a sol, sem direitos, sem reconhecimento.
A despeito de tudo, esse povo corajoso não deixou que se perdesse o único bem que lhes restara a salvo de seus algozes: sua crença.
Em que pese o massacre físico e emocional, os escravos mantiveram acesa a chama da fé. Venceram a opressão, a dor física e o sofrimento moral. Apesar de proibidos de cultuar seus Deuses pela brutalidade dos feitores, encontraram no sincretismo com imagens de Santos católicos, uma forma de lograr os brancos e agradar aos seus ancestrais.
Se hoje, séculos após, podemos livremente bater no peito e erguermos a voz para nos dizermos candomblecistas, devemos àquele Povo heróico, que conseguiu a proeza de, na condição de escravos, perpetuarem sua herança; manterem viva sua memória.
O Candomblé deve sua alma a eles. O Candomblé tem a “alma” deles. Negar isso é negar novamente a alma dos negros.
Os fundadores “dos Candomblés” são nossos ancestres, são nossos “ésà”. São nossos “mais velhos”. São nossos “Pretos Velhos”. Se do Benin, de Angola, do Congo, ou de Kétu. Não sei. Não sei em que terra, ou terreiro. Não sei. Sei que os quero por perto. Bem perto. Salve a alma deles! Adorei as almas!
Salve Joaquim, Benedito, Roque, Maria Joana, Aninha, Senhora, Talabi, Salakó! Salve! Salve Menininha, Salve Stella, Salve Olga, Salve Beata! Salve as almas dos “Pretos”! Salve a viva alma dos “Velhos”!
Arquivo
Frente Brasil Popular MG *Dandara
Tonantzin é pedagoga, mestranda em educação e vereadora pelo PT em Uberlândia
-MG
A liberdade nunca bateu na nossa porta: 133 anos de
falsa abolição Três séculos de tortura, assassinato, privação de liberdades e
estupros não se apagaram em 133 anos de abolição da escravatura. O genocídio
continua.
A história oficial nos
conta que no dia 13 de maio de 1888 a “benevolente” princesa Isabel assinou a
Lei Áurea, salvando o povo negro dos horrores da escravidão. O que não consta
nos livros tradicionais é que a abolição foi fruto de muita luta de nossos antepassados,
que resistiram com fugas organizadas dos cativeiros, rebeliões, quilombos e
lutas abolicionistas. De salvadora a princesa branca não teve nada; a lei foi
assinada por pressão econômica internacional inglesa que desde 1845 proibia o
tráfico negreiro.
Cerca de 4,8 milhões de
africanos foram sequestrados de suas famílias e encarcerados em navios
tumbeiros para o Brasil. O trajeto era desumano e a vida dos sobreviventes era
rodeada de perversidade. Latifúndios eram campos de concentração onde pessoas
escravizadas eram tratadas pior que animais de carga. Apesar de tanta dor,
sobrevivemos e construímos esse país à sangue e suor. A contribuição que demos
para a construção da pátria ainda é negada. Ainda aparecemos nos livros de
história somente nas páginas que remetem ao crime da escravidão.
Somos bisnetos (as) de
guerreiros e guerreiras, que saíram da escravidão sem reparação alguma, sem
direitos à terra, à educação ou moradia. Sem perspectivas, o povo negro começou
a habitar as periferias ao redor dos centros urbanos que se formavam. No dia
14, após a lei de abolição, o que restou para nós?
Por isso hoje não
comemoramos a falsa abolição, chancelada pelo viés branco. Hoje exigimos
respeito e igualdade, mesmo que tardia. A escravidão deixou marcas na nossa história.
No momento em que nascia o Brasil, a escravidão era mais do que somente um
modelo econômico, era um sistema político, cultural, social, que constituiu
valores, que organizou geopoliticamente as cidades, determinou lugares e não
lugares. O preconceito racial se enraizou de tal maneira em nossa sociedade que
o racismo se tornou estrutural, presente nos discursos de ódio da internet, nas
piadinhas sobre o cabelo ou traços afros, na ausência de pessoas negras em
cargos de liderança e espaços de poder.
Hoje, negros são 79,1%
das vítimas de intervenções policiais que resultam em morte, de acordo com o
Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2020. Somos também 66,7% dos
encarcerados nas prisões brasileiras. Durante a pandemia de Covid-19 morreram
40% mais pretos e pardos do que brancos.
A chacina de
Jacarezinho, no dia 06 de maio, nos lembra que os fantasmas da escravidão
seguem os passos de cada pessoa negra nesse país: Na desvalorização, no medo,
na perseguição, na fome, nos estigmas, na bala perdida que sempre encontra o
corpo negro. Nossa cor de pele é alvo. Nossa cultura, nossos ritmos, nossa fé.
No dia 13 de maio de
2021 são milhares de mães pretas que velam seus filhos assassinados,
desaparecidos, crimes que nunca tiveram justiça. Miguel Santana, Clayton da
Silva Freitas Lima, Cláudia Silva Ferreira, Ray Pinto Faria, Jenifer Gomes e
tantos mais. Se tornaram vítimas de sistema cruel, onde o preto é suspeito e
nossas lágrimas não importam.
Temos pressa para que as
coisas mudem. Já são 133 anos de um grito preso na garganta. Diferente do que
canta o hino nacional, o sol da liberdade não raiou para todos (as) nós. É
cansativo ainda lutarmos pela quebra das correntes do racismo.
Ocupamos espaços
importes, por exemplo, sou uma mulher negra na Câmara de Vereadores de
Uberlândia. Olho para o lado e vejo os herdeiros da casa grande até hoje no
poder. Não toleram a nossa presença, incomodamos. Nada para o povo preto foi de
graça, ou por acaso. A libertação nunca bateu na nossa porta. Tudo foi, tudo
será: LUTA.
O coronel Carlos Cerqueira foi o policial negro que tentou humanizar a Polícia Militar do Rio de Janeiro e acabou assassinado em um crime até hoje polêmico.
Nos anos 80, o coronel Carlos Magno Nazareth Cerqueira já tinha pelo menos duas décadas de trabalho
policial. Ele foi nomeado pelo governador Leonel Brizola para ocupar o cargo de
Secretário Chefe de Polícia Militar, órgão recém-criado pelo então governador
do Rio de Janeiro, em 1983.
Por ser visto como um
homem que perseguia policiais e atrapalhava negócios escusos da polícia, Carlos
Cerqueira foi perseguido pela própria instituição. Tendo feito muitos inimigos
na alta cúpula policial.
Em 1999, o coronel, já
reformado, participava de uma reunião da ONG de direitos humanos da qual fazia
parte, no edifício Magnus, na cidade do Rio, Cerqueira foi assassinado no
saguão do prédio onde trabalha o advogado Nilo Batista, ex-vice-governador.
Duas horas depois, a
polícia dava o crime como praticamente elucidado. O assassino seria o sargento
Sidney Rodrigues, da PM, atingido, em seguida ao crime, por um tiro na nuca,
supostamente disparado por um segurança da terma Aeroporto, que funciona no
térreo do edifício.
Cerqueira chegou ao
prédio (avenida Beira Mar, 216, centro) pouco depois das 16h. Ele trabalhava
com Nilo Batista no Instituto Carioca de Criminologia, uma ONG (organização
não-governamental).
Testemunhas contaram aos
policiais responsáveis pela investigação que o sargento atirou com um revólver
assim que o coronel parou no saguão à espera do elevador.
Segundo as testemunhas,
o tiro atraiu pelo menos dois seguranças da terma. O suspeito teria enfrentado
os seguranças, mas foi baleado. Às 19h, ele estava sendo operado no hospital
Souza Aguiar (centro).
Cerqueira morreu na
hora. Há controvérsias sobre se ele esboçou reação. Debaixo do cadáver, o
perito Oswaldo de Paiva Netto, do Instituto de Criminalística Carlos Éboli,
achou um coldre vazio. A arma não apareceu.
O perito encontrou uma
cápsula de bala calibre 38 no corredor dos fundos do prédio. Encontrou ainda
uma marca de tiro na parede do saguão, mas a cápsula não foi localizada.
Foi apreendido no local
o revólver 38 que teria sido usado pelo assassino, A arma tinha quatro cápsulas
deflagradas.
Pessoas que trabalhavam
no prédio contaram ter ouvido cinco ou seis disparos. A polícia recebeu de um
flanelinha (pessoa que toma conta de carros na rua) a informação de que um
homem negro e alto teria fugido em correria logo após os tiros.
Retrato falado do
suposto assassino coincide com o semblante do sargento, disse à noite o
delegado Gilberto Ribeiro, da 5ª DP, delegacia responsável pela área onde o
crime ocorreu.
Pai de sete filhos,
Cerqueira estava aposentado na Polícia Militar, desde o fim do segundo governo
de Brizola, em 94.
Estudioso da questão da
violência, ele trabalhava como vice-presidente da ONG, que funciona no
escritório de Nilo Batista.
Interdição
Depois do crime, o
prédio foi interditado. Todas as pessoas que estavam nos escritórios de seus 13
andares foram cadastradas. Ninguém entrava ou saía do prédio sem autorização.
O coronel Valmir Brum,
da Central de Inquéritos da Procuradoria Geral de Justiça, disse que vingança é
a hipótese mais provável.
"Quem fez isso, fez
para matar", afirmou ele.
Basquete
Subsecretário da Casa
Militar no segundo governo Brizola, o coronel Heleno Barbosa disse que
Cerqueira se encontraria no prédio com Nilo Batista.
Os dois seguiriam para
uma partida de basquete, esporte preferido do coronel.
"O coronel
Cerqueira era um homem íntegro, defensor dos direitos humanos e que instituiu o
policiamento comunitário. Foi um crime bárbaro", afirmou Brum.